Ode ao amor

Hoje dedico ao amor esta minha sobrevivência fúnebre.
O vazio deste corpo em que habito.
Dedico a este amor corrosivo toda gota de sangue e baba, tudo que invade, ocupa e depois supura.
Os fados que ouvi, as peles em que existi, as carnes em que errei, os suores que provei, os cheiros em que me descobri e os olhos que vesti.

Dedico ao amor cada inexistência no presente, cada dia em que vivi ausente de mim.
Esta carne que rejeito.
Este pedaço de alma recalcada de um outro pedaço que já se foi.
Esta vontade guardada a voar pela janela
Dedico ao amor este peito rasgado untado em vinho e tudo o que já quis ser meu.
Esta imensa vontade de implorar, de ser fraco, e de suplicar pela pele alheia.
Esta vontade de obedecer e quer tudo o que não foi. A fantasia cicatrizada do que poderia ter sido
A fantasia de cada pedaço de amor que existiu e está colada em algum rosto, algum sorriso, algum objeto ou ponte, uma gota de lágrima.
Arde qualquer imagem amarela de passado.
E que hoje é um trago macio
Hoje é um fogo.
Dedico ao amor cada erupção sangrenta e invasiva desta alma peregrina boquiaberta de desejo.

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